Goiânia vive
uma situação sui generis em termos de meio ambiente. Embora uma grande empresa
venha poluindo a cidade, sistematicamente, há quatro anos, com danos ambientais
de proporções cada vez maiores e mais graves, os órgãos ambientais nada fazem
para coibir a ação, bem como o Ministério Público. Num jogo de empurra, transferem
as responsabilidades sobre a questão de um para outro, mostrando seu mais
absoluto descaso em relação á preservação ambiental na capital.
A empresa em
questão é a empresa norte-americana Cargill, que comprou, em março de 2011, os
negócios de atomatados da Unilever Brasil por R$ 600 milhões. Com o acordo, a
Cargill passou a ser proprietária das marcas Pomarola, Tarantella, Elefante e
Pomodoro. A gigante norte-americana já era dona das marcas Lisa e Gallo no
País. O segmento de atomatados é novo para a Cargill no Brasil e no mundo. O
negócio incluiu a fábrica da Unilever em Goiânia, de 135 mil metros quadrados,
onde já era produzida toda a linha de tomate. O acordo previu que a Unilever
continue usando uma parte da planta para a fabricação de outros produtos.
Desde 2008,
quando a indústria pertencia exclusivamente à Unilever, a empresa desrespeita
sistematicamente a legislação ambiental, lançando lodo nos mananciais de
Goiânia e emitindo fumaça com alto nível de poluição. Entretanto, mesmo tendo
passado para a gestão de outra empresa, os estragos não cessaram. No mês
passado (junho de 2012), a empresa deixou vazar 7 mil litros de ácido
sulfúrico, uma substância altamente tóxica e corrosiva, que contaminou o lençol
freático e feriu um funcionário da empresa.
A situação de
dano ambiental que hoje vemos na Região Norte da capital é a mesma que foi
constatada há quatro anos, no dia 29 de agosto de 2008, quando a Agência
Municipal do Meio Ambiente de Goiânia (Amma) aplicou multa no valor de R$ 10
milhões à empresa Unilever, autuada por poluição atmosférica. Na ocasião, o
fiscal que lavrou o auto de infração sugeriu que o valor aplicado fosse de R$
10 milhões, tendo em vista a grande extensão do dano ambiental, que atingiu 25
bairros de Goiânia.
Como o laudo
técnico comprovou a gravidade do problema, apontando, inclusive, a emissão por
parte da indústria de gases tóxicos em quantidades bem maiores do que aquelas
permitidas pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), o órgão optou pela
manutenção do valor inicial da multa. Na época, a empresa foi notificada da
autuação pela Amma e convocada a firmar com um TAC com o Ministério Público, mas
recusou-se a fazê-lo.
Como a empresa não tomou as providências
necessárias para solucionar o dano causado, a Amma chegou, na época, a pedir a
interdição dessa unidade da indústria e solicitou ao governo do Estado, por
meio da Semarh, suspensão da licença ambiental da empresa. Entretanto, a Semarh
não tomou as devidas providências e o mesmo problema vem se repetindo, ano após
ano. A Amma também lavou as mãos em relação ao caso.
Diante disso,
faço algumas perguntas:
Para a
Cargill:
1- Os danos ambientais que a empresa vêm
causando à população e ao meio ambiente são constantes e têm se agravado, ao
longo de quatro anos. Agora, além de emitir um odor fétido, a empresa também
deixa vazar substâncias altamente poluentes, como o ácido sulfúrico. Por que a
indústria insiste em ser reincidente em crime ambiental? Se ela vem tomando
providências, onde estão os laudos técnicos que comprovam isso?
2- De acordo com o artigo 66 do decreto
federal 6.514 de 22 de julho de 2008, adotado em agosto pelo município de
Goiânia, o funcionamento de obras ou serviços potencialmente poluidores em
desacordo com a licença obtida, contrariando as normas legais e regulamentos
pertinentes, pode resultar em multa de R$ 500,00 a R$ 10 milhões. Não seria
mais barato para a empresa fazer as adequações necessárias em sua estrutura do
que pagar uma multa de 10 milhões por crime ambiental?
3- Os moradores da Região de Norte estão
totalmente revoltados com a empresa, em função do desrespeito com o meio
ambiente e a saúde pública. Como e quando a Cargill pretende reverter sua
péssima imagem junto à população e mostrar que respeita as leis ambientais?
4- Em 2008, na época da fiscalização da
Amma, apesar de todas as evidências dos laudos, a Unilever negou que estivesse
cometendo crime ambiental e chegou a entrar com pedido de liminar na Justiça,
para punir o ex-presidente do órgão, Clarismino Junior, com R$ 400 mil de multa
a cada vez que ele pronunciasse o nome da empresa, e pedindo que os técnicos do
órgão ficassem a, no mínimo, 100 metros de distância da indústria. A Cargill
vai repetir essa postura agora?
5- Apesar de alegar sua inocência no caso,
a Unilever recusou-se terminantemente a assinar um Termo de Ajustamento de
Conduta com o Ministério Público em 2008. Um TAC foi assinado entre Cargill e
MP, no ano passado, mas o documento não surtiu efeito. A sociedade tem alguma
razão para acreditar que agora a empresa vai cumprir o que acordado com o MP?
Para a Semarh
1- Há quatro anos a Unilever é reincidente
em crime ambiental, colocando em risco os recursos naturais e a saúde pública
dos moradores dos bairros da Região Norte de Goiânia. Embora tenha sido autuada
com pesadas multas e desperte a revolta da população, continua funcionando sem
empecilhos. Por que, ao longo de todo esse período, o governo do Estado nunca
cassou a licença de funcionamento da indústria?
2- Por que firmar um TAC com uma indústria
que já provou que não respeita a legislação ambiental e a população? Isso não é
ser complacente com um agente poluidor com alto grau de reincidência? Se os
termos acordados no TAC não forem respeitados, que providências a Semarh vai
tomar?
3- Que garantias a Secretaria dá à
população de Goiânia de que, dessa vez o problema de vazamentos de produtos
altamente tóxicos e poluentes, como o ácido sulfúrico, e o mau cheiro, serão
solucionados, diante de um histórico de anos de omissão e negligência?
Para o
Ministério Público
1- A Amma propôs à Unilever, em 2008, que
firmasse um TAC com o MP para fazer as adequações necessárias na indústria e
acabar com o problema do mau cheiro. A empresa negou-se terminantemente e ainda
entrou com pedido de liminar para obstruir o trabalho de fiscalização da
Prefeitura. Diante disso, e do fato da empresa ser reincidente em crime
ambiental há quatro anos, porque o MP firmou um TAC, em vez de pedir à Justiça
a interdição da indústria? Firmar um TAC, no lugar de pedir a paralisação das
atividades da empresa até que ela resolva o problema, não é ser permissivo?
Para a AMMA
1- O artigo 17 da Lei Complementar 140
determina que “nos casos de iminência ou ocorrência de degradação da qualidade
ambiental, o ente federativo que tiver conhecimento do fato deverá determinar
medidas para evitá-la, fazer cessá-la ou mitigá-la, comunicando imediatamente
ao órgão competente para as providências cabíveis”. Diante disso, minha é: por
que a Amma ainda não interditou a Cargill, se tem poderes para isso? Por que
não interdita a indústria até que providências sejam tomadas?