quinta-feira, 5 de julho de 2012

As perguntas que não querem calar sobre a poluição da Cargill




Goiânia vive uma situação sui generis em termos de meio ambiente. Embora uma grande empresa venha poluindo a cidade, sistematicamente, há quatro anos, com danos ambientais de proporções cada vez maiores e mais graves, os órgãos ambientais nada fazem para coibir a ação, bem como o Ministério Público. Num jogo de empurra, transferem as responsabilidades sobre a questão de um para outro, mostrando seu mais absoluto descaso em relação á preservação ambiental na capital.
A empresa em questão é a empresa norte-americana Cargill, que comprou, em março de 2011, os negócios de atomatados da Unilever Brasil por R$ 600 milhões. Com o acordo, a Cargill passou a ser proprietária das marcas Pomarola, Tarantella, Elefante e Pomodoro. A gigante norte-americana já era dona das marcas Lisa e Gallo no País. O segmento de atomatados é novo para a Cargill no Brasil e no mundo. O negócio incluiu a fábrica da Unilever em Goiânia, de 135 mil metros quadrados, onde já era produzida toda a linha de tomate. O acordo previu que a Unilever continue usando uma parte da planta para a fabricação de outros produtos.
Desde 2008, quando a indústria pertencia exclusivamente à Unilever, a empresa desrespeita sistematicamente a legislação ambiental, lançando lodo nos mananciais de Goiânia e emitindo fumaça com alto nível de poluição. Entretanto, mesmo tendo passado para a gestão de outra empresa, os estragos não cessaram. No mês passado (junho de 2012), a empresa deixou vazar 7 mil litros de ácido sulfúrico, uma substância altamente tóxica e corrosiva, que contaminou o lençol freático e feriu um funcionário da empresa.
A situação de dano ambiental que hoje vemos na Região Norte da capital é a mesma que foi constatada há quatro anos, no dia 29 de agosto de 2008, quando a Agência Municipal do Meio Ambiente de Goiânia (Amma) aplicou multa no valor de R$ 10 milhões à empresa Unilever, autuada por poluição atmosférica. Na ocasião, o fiscal que lavrou o auto de infração sugeriu que o valor aplicado fosse de R$ 10 milhões, tendo em vista a grande extensão do dano ambiental, que atingiu 25 bairros de Goiânia.
Como o laudo técnico comprovou a gravidade do problema, apontando, inclusive, a emissão por parte da indústria de gases tóxicos em quantidades bem maiores do que aquelas permitidas pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), o órgão optou pela manutenção do valor inicial da multa. Na época, a empresa foi notificada da autuação pela Amma e convocada a firmar com um TAC com o Ministério Público, mas recusou-se a fazê-lo.
 Como a empresa não tomou as providências necessárias para solucionar o dano causado, a Amma chegou, na época, a pedir a interdição dessa unidade da indústria e solicitou ao governo do Estado, por meio da Semarh, suspensão da licença ambiental da empresa. Entretanto, a Semarh não tomou as devidas providências e o mesmo problema vem se repetindo, ano após ano. A Amma também lavou as mãos em relação ao caso.
Diante disso, faço algumas perguntas:
Para a Cargill:
1-         Os danos ambientais que a empresa vêm causando à população e ao meio ambiente são constantes e têm se agravado, ao longo de quatro anos. Agora, além de emitir um odor fétido, a empresa também deixa vazar substâncias altamente poluentes, como o ácido sulfúrico. Por que a indústria insiste em ser reincidente em crime ambiental? Se ela vem tomando providências, onde estão os laudos técnicos que comprovam isso?
2-         De acordo com o artigo 66 do decreto federal 6.514 de 22 de julho de 2008, adotado em agosto pelo município de Goiânia, o funcionamento de obras ou serviços potencialmente poluidores em desacordo com a licença obtida, contrariando as normas legais e regulamentos pertinentes, pode resultar em multa de R$ 500,00 a R$ 10 milhões. Não seria mais barato para a empresa fazer as adequações necessárias em sua estrutura do que pagar uma multa de 10 milhões por crime ambiental?
3-         Os moradores da Região de Norte estão totalmente revoltados com a empresa, em função do desrespeito com o meio ambiente e a saúde pública. Como e quando a Cargill pretende reverter sua péssima imagem junto à população e mostrar que respeita as leis ambientais? 
4-         Em 2008, na época da fiscalização da Amma, apesar de todas as evidências dos laudos, a Unilever negou que estivesse cometendo crime ambiental e chegou a entrar com pedido de liminar na Justiça, para punir o ex-presidente do órgão, Clarismino Junior, com R$ 400 mil de multa a cada vez que ele pronunciasse o nome da empresa, e pedindo que os técnicos do órgão ficassem a, no mínimo, 100 metros de distância da indústria. A Cargill vai repetir essa postura agora?
5-         Apesar de alegar sua inocência no caso, a Unilever recusou-se terminantemente a assinar um Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério Público em 2008. Um TAC foi assinado entre Cargill e MP, no ano passado, mas o documento não surtiu efeito. A sociedade tem alguma razão para acreditar que agora a empresa vai cumprir o que acordado com o MP?
Para a Semarh
1-         Há quatro anos a Unilever é reincidente em crime ambiental, colocando em risco os recursos naturais e a saúde pública dos moradores dos bairros da Região Norte de Goiânia. Embora tenha sido autuada com pesadas multas e desperte a revolta da população, continua funcionando sem empecilhos. Por que, ao longo de todo esse período, o governo do Estado nunca cassou a licença de funcionamento da indústria?
2-         Por que firmar um TAC com uma indústria que já provou que não respeita a legislação ambiental e a população? Isso não é ser complacente com um agente poluidor com alto grau de reincidência? Se os termos acordados no TAC não forem respeitados, que providências a Semarh vai tomar?
3-         Que garantias a Secretaria dá à população de Goiânia de que, dessa vez o problema de vazamentos de produtos altamente tóxicos e poluentes, como o ácido sulfúrico, e o mau cheiro, serão solucionados, diante de um histórico de anos de omissão e negligência?
Para o Ministério Público
1-         A Amma propôs à Unilever, em 2008, que firmasse um TAC com o MP para fazer as adequações necessárias na indústria e acabar com o problema do mau cheiro. A empresa negou-se terminantemente e ainda entrou com pedido de liminar para obstruir o trabalho de fiscalização da Prefeitura. Diante disso, e do fato da empresa ser reincidente em crime ambiental há quatro anos, porque o MP firmou um TAC, em vez de pedir à Justiça a interdição da indústria? Firmar um TAC, no lugar de pedir a paralisação das atividades da empresa até que ela resolva o problema, não é ser permissivo?
Para a AMMA
1-         O artigo 17 da Lei Complementar 140 determina que “nos casos de iminência ou ocorrência de degradação da qualidade ambiental, o ente federativo que tiver conhecimento do fato deverá determinar medidas para evitá-la, fazer cessá-la ou mitigá-la, comunicando imediatamente ao órgão competente para as providências cabíveis”. Diante disso, minha é: por que a Amma ainda não interditou a Cargill, se tem poderes para isso? Por que não interdita a indústria até que providências sejam tomadas?